Uma farmácia é o ambiente perfeito para exemplificar o posicionamento estratégico de marca, antes mesmo de você começar a ler.
Afinal, quando você entra numa farmácia com dor de cabeça, procura Ibuprofeno ou Advil? Se você quer fazer a barba, procura lâmina de barbear ou Gilette? Hastes flexíveis com pontas de algodão ou cotonete?
Essas são marcas cujos nomes viraram o termo genérico para outros produtos do mesmo nicho. Todas elas têm duas coisas em comum:
- Todas custam mais caro, geralmente, do que qualquer outro concorrente;
- Todas souberam se posicionar de maneira tão boa que agora já não precisam se preocupar em brigar por visibilidade ou preço, por exemplo.
Isso é o resultado de um branding muito bem feito. E esse branding passa por um Posicionamento Estratégico de Marca.
Um bom posicionamento de marca é essencial para qualquer negócio que almeja o sucesso. Marcas consistentes, constantemente lembradas, têm um aumento de receita entre 10 e 20%.
Mas entender a sua posição relativa aos concorrentes, acertar na comunicação e precificação não são tarefas fáceis – é comum, inclusive, passar a vida toda de uma marca ajustando estratégias e revisitando o posicionamento, conforme o mercado muda.
Existem, no entanto, algumas abordagens que podem ajudar muito, principalmente no início, a entender qual o melhor posicionamento para uma marca e nesse artigo nós vamos te apresentar três delas:
- Relógio de Bowman
- Matriz Funcional, Emocional, Aspiracional
- Matriz de Identidade
Relógio de Bowman
Essa é, das três abordagens apresentadas aqui, com certeza a mais conhecida. Isso porque o Relógio de Bowman oferece, de maneira muito intuitiva, uma análise de custo x benefício do seu produto ou serviço.
Ao determinar em qual setor você e seus concorrentes estão, é possível traçar uma estratégia muito mais clara, tanto de comunicação quanto de preços e disponibilidade do produto.
O relógio de Bowman tem como base a teoria formulada por Michael Porter no livro ”Estratégia Competitiva – Técnicas Para Análise de Indústrias e da Concorrência”, em que Porter define três estratégias clássicas para a obtenção de vantagens competitivas:
- Liderança por Preço
- Diferenciação de Produto
- Segmentação de Mercado
As três estratégias resultam em apenas duas coisas que o cliente pode querer: preços melhores ou mais qualidade. Mas essa matriz parecia simples demais para alguns mercados.
Foi então que, em 1996, baseados nos estudos apresentados por Porter, Cliff Bowman e David Faulkner desenvolveram o Relógio de Bowman.
As três estratégias de Porter viraram oito, com diferentes níveis de percepção de valor e preço.
Posição 1: Preço baixo/valor baixo
Geralmente quem se encontra nessa posição ou não teve muita escolha ou resolveu competir por quantidade. Os produtos são inferiores, o seu cliente sabe que eles são inferiores mas, mesmo assim, às vezes a diferença é tão grande que compensa.
A estratégia nesse setor é vender em grandes volumes, atraindo novos consumidores constantemente e garantindo que, mesmo com preços muito baixos, ainda exista alguma margem.
É uma estratégia muito utilizada por produtos white label, produzidos em massa e que geralmente são encontrados sob diversas marcas diferentes. Em outras palavras, lojas de R$1,99.
Posição 2: Preço baixo
É um setor muito complexo e complicado de competir. Isso porque, normalmente, são empresas com estratégias agressivas e que podem se dar o luxo de passar um bom tempo com margens de lucro pequenas, só para garantir o controle do mercado.
A tendência é que, caso o mercado continue dividido, as empresas entrem numa competição por preço que pode resultar em prejuízo.
A AmBev é um bom exemplo de empresa com atuação nessa posição, quando se analisa apenas as marcas mais baratas do portfólio.
Posição 3: Híbrido
Empresas que fornecem produtos com alto valor percebido a baixos custos.
Normalmente, os exemplos mais claros são empresas pequenas, que produzem em baixo volume mas que ainda não têm presença de mercado suficiente para competir com empresas maiores oferecendo produtos a preços mais altos.
É normal que, assim que essas empresas se tornam mais conhecidas, elas migrem para a posição 4, aumentando o custo dos produtos ou serviços, mantendo, porém, a qualidade do produto.
No entanto, existem empresas como a Ikea, que criou uma lealdade gigantesca oferecendo produtos de alto valor percebido a preços razoáveis.
É normal, também, que empresas nessa posição se apoiem em conexões mais profundas com o cliente, por exemplo através de uma causa social, como a Lush, marca de cosméticos produzidos de maneira ética. Isso aumenta o valor percebido e, não necessariamente, reflete em preços mais altos.
Posição 4: Diferenciação
Ao diferenciar um produto ou serviço dos demais concorrentes, algumas marcas conseguem o nível mais alto de percepção de valor possível.
Aqui, a qualidade do produto e o branding têm um papel crucial. Produtos de alta qualidade e uma marca robusta são fatores que permitem a cobrança de valores mais altos.
A Apple pode, aqui no Brasil, ser vista como uma marca da posição 5. Mas, para todos os efeitos, ela é a definição de diferenciação.
Eles têm tudo para isso: Um branding que é, por muitos, considerado o melhor do mundo, produtos de qualidade reconhecida e a disponibilidade de tecnologias e recursos de vanguarda.
Posição 5: Diferenciação Focada
Aqui nós entramos no mercado de luxo. Marcas que são a definição de valor percebido, com pessoas dispostas a pagar 10, 20 vezes o que se pagaria no produto de um concorrente ‘custo-benefício’.
Muitas vezes, o valor percebido está diretamente relacionado ao status que a marca proporciona e, não necessariamente, ao custo de produção ou vantagens reais que o produto oferece.
Um Rolex, por exemplo, faz exatamente a mesma coisa que o relógio do seu celular: mostrar que horas são. Com a diferença que o Rolex é infinitamente menos preciso e dezenas de vezes mais caro. O que leva as pessoas a comprarem um relógio de 50, 100 mil reais, então (e ainda esperar meses ou anos por isso)?
Boa parte disso se deve ao branding. Um Rolex é facilmente reconhecido à distância por quem entende minimamente de relógios. E, sendo um símbolo de status, as pessoas que usam um Rolex querem que ele seja reconhecido mesmo.
Além disso, esse branding envolve um bom tanto de storytelling. Ainda no exemplo da Rolex, toda marca de luxo se orgulha de manter processos manuais, delicados e complexos, como parte da construção da marca. O mecanismo de um Rolex tem, no mínimo, 200 componentes, todos feitos a mão e todos feitos na Suíça.
O valor percebido aumenta consideravelmente quando você apresenta esse tipo de dado para o cliente. Mas essa não é uma tarefa fácil. Essa é uma posição extremamente exigente e competitiva.
Posição 6: Margens Altas e Arriscadas
Quando o valor percebido não é tão alto quanto o preço que se cobra, é aqui que uma marca se encaixa.
É, como o nome já diz, uma posição arriscada. No entanto, é uma posição de lucros altíssimos quando o mercado se encontra em desequilíbrio.
O exemplo ideal aqui é o preço das máscaras cirúrgicas no início da pandemia. Não existia um substituto, todo mundo precisava e o mercado não estava pronto para suprir a demanda.
Mas, a exemplo das máscaras, os preços altos são temporários, geralmente só até a maioria dos consumidores encontrar uma alternativa.
Posição 7: Preço de Monopólio
Mais uma vez, o nome é autoexplicativo.
Se existe um monopólio, ou até mesmo um oligopólio, a empresa dominante não liga para valor percebido ou preços. O consumidor depende diretamente dela para atender a demanda.
Como resultado, a empresa pode (a não ser que algum órgão regulador diga o contrário) cobrar o quanto quiser.
Posição 8: Perda de participação de Mercado
A perda de market share envolve produtos com valor percebido baixo e preços desproporcionalmente altos.
Definir um preço ‘no meio do caminho’ para um produto de baixo valor percebido é insustentável. Por isso, essa pode até ser uma estratégia de curto prazo mas, com o tempo, é necessário ou melhorar a percepção de valor ou reajustar os preços para baixo.
Muitas vezes uma empresa acaba entrando nessa posição por uma movimentação dos concorrentes, a exemplo da Blackberry em 2007, ano de lançamento do iPhone.
Até o momento em que a Apple lançou o primeiro Smartphone, a BlackBerry dominava o segmento de celulares premium.
Mas, a partir do surgimento do iPhone, seguido dos primeiros Android em 2008, a BlackBerry entrou em uma derrocada que culminou no encerramento das atividades da empresa em 2022.
Para dar um panorama da situação: em 2010, três anos após o lançamento do primeiro iPhone, a BlackBerry tinha 43% do market share. Em 2013, esse número caiu para 3,8%.
Funcional x Emocional x Aspiracional
Essa é uma matriz que correlaciona, diretamente, a motivação de compra do cliente com o tom de voz utilizado pela marca na comunicação.
A motivação de compra e o tom de voz utilizado são correlacionáveis justamente porque cada motivação requer uma abordagem específica.
No primeiro terço, onde a motivação de compra é mais pela necessidade, o tom de comunicação deve ser mais racional.
O seu cliente está, nesse caso, comprando por necessidade, e não simplesmente pelo desejo.
Por isso, vale muito mais a pena e faz mais sentido se comunicar de maneira direta, demonstrando claramente quais dores o seu produto ou serviço soluciona, como ele faz isso e como você se diferencia dos concorrentes. Simples e direto ao ponto.
No terço central, parte da motivação é a necessidade mas, ao mesmo tempo, existe o desejo.
Aqui a comunicação pode envolver uma comunicação mais baseada no encantamento, mostrando a conexão da marca com valores, ideais e visão de mundo, sem esquecer, no entanto, nos benefícios práticos que o seu produto tem a oferecer.
No último terço, a motivação de compra é totalmente aspiracional. O que você oferece não é essencial para o cliente, mas é um objeto de desejo.
Por isso, não adianta muito falar de qualidades práticas do seu produto e o que ele pode fazer pelo cliente, mas sim entrar num campo mais simbólico da comunicação, entrando totalmente em valores, coisas que conectam o cliente ao seu universo.
Matriz de Identidade
Ao atrelar a sua marca a características humanas, você aproxima o seu negócio dos clientes, principalmente em negócios B2C.
Essa matriz faz sentido especialmente quando você posiciona os concorrentes dentro dela, junto com você. Nesse caso, se um dos quadrantes está vazio, por exemplo, essa pode ser uma oportunidade de diferenciação, como fica claro na imagem acima.
No exemplo, a gente apresenta empresas do ramo de educação. Ao observar o número de concorrentes em cada quadrante, fica claro que uma marca com tom de voz mais divertido e focado em performance tem mais chances de se destacar, justamente pela quantidade menor de concorrentes que utilizam esse tom de voz.
É sempre bom lembrar que aqui não existe, necessariamente, certo ou errado. Lógico, alguns negócios requerem mais sobriedade e seriedade do que outros, por exemplo.
Mas, sabendo criar um posicionamento de marca conciso, partir por um caminho ousado e que ninguém tentou antes pode ser exatamente o que você precisa.
Quando usar cada uma dessas abordagens no Posicionamento Estratégico
É essencial entender o mercado, seu consumidor e a sua própria marca para criar um posicionamento estratégico de marca coerente.
O Relógio de Bowman traz uma visão muito mais de produto, precificação e posicionamento em termos de valor percebido/custo.
Essa é uma visão crucial para começar a planejar como você vai vender a sua marca, a que preço, para quem e quais serão os seus concorrentes diretos.
A Matriz Funcional x Emocional x Aspiracional complementa o Relógio de Bowman, posicionando a sua marca diante das necessidades do cliente.
Já a Matriz de Identidade permite entender como você vai se comunicar com o cliente, diferenciando a sua marca das demais através do branding, o que pode ser o início da construção de uma marca forte e com presença de mercado.
Todas são visões necessárias para um negócio de sucesso, cabe a você entender agora onde o seu negócio pode melhorar.