A importância de ter amigos no trabalho e como isso afeta tudo à sua volta
Você consegue imaginar quantas pessoas consideram não ter nenhum amigo no mundo? Mais de 300 milhões de pessoas dizem não ter amigos. E mais de 20% diz não ter ninguém, nem amigos nem família, com as quais possam contar. Ao mesmo tempo, a gente passa em média 81.396 horas das nossas vidas (ou cerca de 9 anos) no trabalho e temos uma tendência a fazer mais amigos no trabalho do que em qualquer outro ambiente nas nossas vidas (inclusive na escola ou através de outros amigos).
Faria sentido, portanto, que as empresas investissem no bem-estar social dos empregados, não? Mas não é o que acontece. A mesma pesquisa apontou que esse é o ponto em que as empresas menos investem, de acordo com CHROs do mundo todo.
Ainda de acordo com a Gallup, mas agora em outra pesquisa, só três em casa dez pessoas considera que tem um ‘melhor amigo’ no trabalho.
E por que as empresas deveriam se importar?
Um dos pontos cruciais da resiliência é a amizade. Ter alguém com quem desabafar, que te faça se sentir melhor e com quem você possa celebrar ou compartilhar inseguranças e momentos ruins é essencial. Ora, se isso é essencial em todos os nossos momentos pessoais, então por que não seria nos profissionais, onde nós passamos grande parte da vida adulta?
Ter uma pessoa que entenda a sua rotina de trabalho, a dinâmica e as pessoas envolvidas ajuda, e muito, a aliviar o stress diário. De novo, a série de artigos da Gallup sobre amizade no trabalho, mostra com clareza que ter um melhor amigo no trabalho está diretamente relacionado a permanecer nele. Essa afirmação também está diretamente relacionada ao esforço que um funcionário faz. 63% das mulheres que responderam que têm uma amizade forte no trabalho dizem engajar mais que o dobro em seus empregos, contra 29% das que disseram não ter uma amizade forte.
Ao mesmo tempo, amigos colaboram de maneira saudável, ao invés de criar o ambiente tóxico de competição que se espalha pelo meio corporativo. A mesma série de artigos da Gallup mostrou que as amizades estão fortemente ligadas à rentabilidade, segurança, controle de inventário e tarefas e retenção.
Tudo isso afeta diretamente nos indicadores de produtividade e satisfação das empresas: o relacionamento ficou em primeiro, dentre 12 categorias usadas para explicar a satisfação no trabalho em um estudo global da Universidade de Oxford.
Existem ainda outras vantagens indiretas:
- Pessoas que têm muitos amigos no trabalho se sentem mais confortáveis em trazer outros amigos talentosos para dentro;
- Trabalhar com bons amigos em cargos estratégicos te deixa muito mais confortável para tentar inovar e compartilhar ideias;
- Com o trabalho remoto, ter bons amigos é praticamente essencial para manter uma vida social ativa no trabalho;
- E, não menos importante, torna o trabalho mais divertido.
A dificuldade de fazer amigos no trabalho
Mesmo antes da onda de trabalho remoto, 76% dos executivos dizia ter dificuldade em fazer amizades no trabalho e 58% descrevia suas relações no trabalho como superficiais. Muita gente tem medo de amizades no trabalho por achar que é tudo um jogo de interesses ou que não pode confiar nos colegas.
Isso deriva, primordialmente, de um ambiente de trabalho tóxico. Esse foi, inclusive, o motivo número para pessoas deixarem um emprego em 2021 e pode ser incrivelmente difícil superar as consequências desse ambiente.
Nada mais justo, então, do que começar falando como se recuperar de um emprego tóxico.
Encontre um encerramento
E aqui a gente tá falando de encerrar um ciclo mesmo. Às vezes nosso cérebro precisa de um encerramento cognitivo. Ou seja, um sinal claro, vindo de você mesmo, de que algo se encerrou. Muitas vezes esse ciclo leva um certo tempo, mas ele pode ser acelerado com um diário ou uma carta de despedida (que você obviamente não vai enviar), deletar os arquivos do trabalho anterior (desde que tudo tenha se resolvido) e jogar fora coisas que lembrem o ambiente antigo, como crachás ou uniformes.
Pode parecer besteira, mas é um processo muitas vezes necessário e tem um embasamento científico. Esse artigo aqui da New Yorker explica bem melhor do que eu conseguiria.
Só tente controlar o que você consegue
Suponhamos que você saiu do seu último emprego porque seu chefe cobrava que você estivesse disponível 24 horas por dia, quando seu trabalho era claramente em horário comercial. Ao invés de, no novo emprego, se esforçar pra mostrar que está disponível o tempo todo, talvez seja melhor trabalhar habilidades como gerenciamento de tempo e assertividade. Se antes você acabava trabalhando além do horário por não conseguir impor limites, talvez a habilidade que te falta seja justamente se impor.
Aprender a se comunicar, estabelecer limites e deixar claras suas expectativas vai ajudar muito mais do que simplesmente se mostrar disponível a hora que todo mundo precisa.
Prepare-se para entender gatilhos
Entender situações que te colocam na mesma situação de stress que você já passou é essencial. Entender os gatilhos te fornece um plano de ação para lidar com eles da melhor maneira possível.
Aprenda a apreciar os momentos positivos
Nosso cérebro está sempre a postos para potenciais perigos, mas isso é amplificado depois de situações traumáticas. Isso nos faz dar muito mais atenção para comentários negativos, críticas e ameaças. Exercitar a habilidade de apreciar comentários positivos e transformá-los em uma experiência positiva é essencial para superar esses traumas.
Esteja aberto a compartilhar suas experiências com os outros
Aqui a gente volta lá no começo do texto: assim que você entender que pode confiar nos colegas de trabalho, você está pronto para de fato começar amizades no trabalho. Todo mundo tem níveis de conforto diferentes quanto à intimidade, então entender a seu própria zona de conforto é essencial.
Finalmente, fazendo amigos no trabalho (e como a sua empresa pode ajudar nisso)
Existem infinitas maneiras que uma amizade pode começar dentro do ambiente de trabalho. Seja ele presencial, híbrido ou remoto, fato é que se a própria empresa não estimular que isso aconteça, as coisas ficam bem mais difíceis.
Ter um sistema de ‘tutor’ ajuda bastante
Especialmente quando a gente chega na empresa pela primeira vez, tudo é muito intimidador. Isso pode ser um fato inclusive quando a gente muda de setor ou cargo. Nada melhor, então, do que colocar um funcionário veterano para ajudar tanto na ambientação quanto a entender as dinâmicas de trabalho e relacionamento.
Um empregado experiente pode não só dar dicas de trabalho, mas também mostrar regras ‘não escritas’, tipo quem senta onde ou um segredo da máquina de café. Tudo isso é valiosíssimo para quem está se sentindo deslocado. O segredo aqui é a frequência dessa interação: não adianta nada ter alguém do seu lado no primeiro dia e, no segundo, estar por conta própria.
Pra ter uma ideia: quando a Microsoft implantou um sistema desses, os novatos que encontraram com o tutor mais de oito vezes nos primeiros 90 dias disseram, 97% das vezes, que esses encontros os ajudaram a ser mais produtivos. Quando eles só viram o veterano uma vez nos três primeiros meses, esse número caiu para 56%.
Aumente as interações cara a cara
Aqui a gente não tá nem falando de trabalhar presencialmente. Mas, no mínimo, de abrir a câmera de vez em quando numa chamada ao invés de mandar um e-mail. A maior causa de reclamações sobre o trabalho remoto em 2020 foi a falta de interação com outros funcionários.
Isso tem muitos motivos: um e-mail dá margem para infinitas interpretações de tom de voz ou significados ocultos, além de ser um modelo de comunicação assíncrona, onde tudo demora muito mais para se resolver. Além disso, existe uma necessidade cognitiva de ver a cara das pessoas com quem a gente fala. Muito do que nós entendemos vem de expressões faciais e corporais, e não da comunicação verbal.
Por sorte, existem inúmeras soluções também: simplesmente abrir a câmera mais vezes em reuniões é uma delas. Estabelecer dias de trabalho presencial, mudar a configuração das salas para evitar que as pessoas se comuniquem por mensagem estando no mesmo ambiente, rotacionar cargos de trabalho ou times… Outra solução que, particularmente a gente gosta bastante aqui na Traction, é organizar eventos presenciais, sejam eles durante o horário de trabalho ou fora. Trazer as pessoas para perto umas das outras é essencial para criar relações mais próximas e duradouras.
Estimule a criatividade coletiva
Quando todo mundo está alinhado em um mesmo propósito, a tendência de criar uma conexão é muito maior. A alegria deixa de vir necessariamente dos momentos de folga e passa a vir do trabalho também. Um dos melhores jeitos de fazer com que todos se sintam parte desse propósito comum é estimular sessões (ou reuniões, como preferir) onde a única meta é ser criativo. A satisfação de criar algo enquanto você se diverte é inerente ao ser humano e os funcionários querem fazer parte dessa tarefa que geralmente é reservada a cargos estratégicos. Isso faz com que todos engajem muito mais, inovem mais e se sintam confortáveis no ambiente de trabalho.
Não force a barra
Antes da pandemia o ideal de ambiente de trabalho eram os escritórios com escorregador, mesa de pebolim (ou totó) e pufe. Isso nada mais era do que uma tentativa de fazer com que as pessoas passem mais tempo no trabalho. Mas ninguém me perguntou se eu gostava de jogar pebolim, você pode argumentar. E você está certo: essa é só uma tentativa de parecer descolado pra estimular os funcionários a irem trabalhar no escritório.
No fim, a verdade é que se as pessoas realmente gostam umas das outras, não vai ser uma mesa de pebolim, sinuca ou ping-pong que vai mudar alguma coisa. É importante entender como as pessoas gostam de interagir e o que elas de fato preferem. Não adianta ter a mesa de pebolim se ninguém tem tempo de jogar, ou se, 18:00 em ponto todo mundo tá correndo pra casa.
Entender como as relações funcionam é complexo, mas ignorá-las é ignorar parte da essência humana. E a essência sempre vai ganhar quando jogar contra a cultura da empresa.
De novo: 20% das pessoas acha que não tem ninguém com quem possa contar. Se os seus empregados se sentem sozinhos no trabalho, eles com certeza acham o trabalho miserável. Mas se a sua empresa prioriza o bem-estar e a convivência no trabalho, dá a oportunidade das pessoas criarem conexões e se sentirem seguras, então elas vão amar trabalhar.