Customer Experience é cada vez mais determinante para o sucesso de um negócio.
Graças a marcas que elevam o conceito de Customer Experience ao máximo, todos estão sendo obrigados a melhorar seus serviços constantemente. Marcas como Disney e Bass Pro Shops (dos EUA) ou Coffee Lab e Dengo (pra citar exemplos nacionais), elevam o padrão de experiência a níveis altíssimos, fazendo o consumidor de fato se sentir imerso no universo da marca.
Resta a quem compete com eles entender como fazem isso e tentar oferecer uma experiência semelhante. Caso falhem nessa missão, correm o risco de perder cada vez mais consumidores e vê-los virando consumidores leais da concorrência.
O artigo em que eu me baseei pra escrever esse aqui cita a Starbucks Reserve, um espaço em lojas específicas onde os clientes podem acompanhar todo o processo de torra e moagem, além de terem acesso a mixologistas criando drinks exclusivos. E por isso eu citei aqui o Coffee Lab, que faz a mesma coisa, mas num padrão muito mais elevado.
Claro que aqui a gente tá falando de marcas premium. Mas não precisa necessariamente pagar caro pra ter acesso a uma experiência melhor. A Avelo, por exemplo, companhia aérea focada em baixo custo, só faz voos de e para aeroportos pequenos e acessíveis, além de encorajar os passageiros a despachar a bagagem. Isso tudo acelera o processo de embarque e desembarque. Além disso, eles acabaram com as taxas de trocas de voos. Tudo isso torna a experiência muito mais agradável, o que é raríssimo em companhias aéreas de maneira geral, quanto mais nas de baixo custo.
Essas experiências todas servem só um propósito: criar uma relação mais próxima entre o cliente e a marca e tornar ele mais leal.
Faz um exercício aqui: pensa numa marca com a qual você teve uma experiência péssima. Você cogitou comprar essa mesma marca de novo? A não ser que você não tenha outra opção, eu aposto que não.
Agora pensa numa marca que, na primeira compra, te surpreendeu. Você com certeza já pensou em comprar de novo, se não tiver comprado ainda.
Isso tudo tem uma explicação científica, neurológica: uma resposta emocional muito poderosa sobrecarrega a nossa memória. Pensa no melhor filme que você já assistiu, ou no perfume de alguém que você ama muito. Com certeza é uma memória muito vívida, né? Parece até que você está assistindo o filme ou sentindo o perfume agora.
Essas são respostas inconscientes, então é muito difícil mensurar esse tipo de coisa com dados ou números. Se alguém pede pra você quantificar uma resposta emocional, parece que o cérebro bloqueia a informação na hora. E, se mesmo assim você insistir, seu cérebro vai te fazer mentir só pra criar uma resposta.
Essa resposta está sujeita a diversos fatores que mascaram os dados, como aceitabilidade social, congruência com a sua personalidade e vieses da própria pergunta. Por isso, estudar esse assunto exige outras ferramentas: analisando a atividade cerebral, é possível contornar a parte consciente do cérebro e acessar a informação “limpa”.
A pesquisa que deu origem a esse artigo, então, define um estado chamado de IMERSÃO.
No estado de imersão, a dopamina se liga a receptores no córtex pré-frontal. Isso dá um sinal de alerta para o cérebro de que alguma coisa importante vai acontecer. O segundo componente do estado de imersão é a liberação de ocitocina no tronco cerebral. A ocitocina desencadeia uma ressonância emocional com a experiência que a pessoa está tendo.
Essa atividade cerebral pode ser monitorada para obter um panorama detalhado sobre o cérebro do consumidor, no que ele se atenta quando fica feliz. E é essa combinação que torna uma experiência memorável e nos faz querer repetir.
Essas substâncias, dopamina e ocitocina, são tão importantes que, em estudos controlados com fármacos que potencializam os efeitos delas, voluntários se sentiram mais propensos a doar mais dinheiro e para mais causas. A administração de ocitocina sintética fez pessoas quererem pagar mais por produtos, aumentou a percepção delas sobre a competência de marcas e o uso de linguagem emocional ao descrever essas marcas.
Por outro lado, quando não há essa ressonância emocional, o cérebro não se conecta com o que está acontecendo, e a pessoa não se sente animada. O autor chama isso de FRUSTRAÇÃO. Aqui acontece basicamente o oposto: o valor percebido diminui, as pessoas se sentem menos propensas a falar de maneira emocional sobre a marca, acabam gastando menos e não pensam em repetir a compra.
Identificar esses momentos de imersão e frustração é essencial para que as marcas tenham sucesso com clientes que se identificam e evitem os que não gostam.
Design thinking, Neurociências e Customer Experience
Normalmente os times de produtos e inovação usam o conceito de DESIGN THINKING para entender e melhor a experiência do consumidor. O problema disso a gente já viu lá no começo: quando a gente pede pra uma pessoa mensurar uma resposta emocional, o cérebro trava e não sabe o que fazer. E é aí que entra a neurociência: ver o cérebro em tempo real ajuda não só a evitar as “mentiras” que o cérebro conta, mas a criar uma empatia com o que o consumidor realmente quer, definindo os problemas a serem solucionados e testar as possíveis soluções.
No fim, a gente nem precisa de acesso livre ao cérebro de nenhum cliente. Só de entender os conceitos por trás já é um grande avanço.
Os passos pra isso são três:
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EMPATIA
A meta aqui é entender quais as necessidades do consumidor.
Pra isso é preciso ter certeza que as pessoas se sentem 100% seguras psicologicamente ao participar de qualquer estudo. Sem isso, o cérebro começa a liberar norepinefrina, um neurotransmissor ligado ao medo e desconfiança, que inibe a liberação da ocitocina, essencial para atingir o estado de imersão.
Os times que conduzem os testes geralmente ficam acelerando os participantes (focando em eficiência e rapidez), ao invés de garantir que eles estejam relaxados.
Um jeito bem simples de contornar isso é literalmente oferecer um lanchinho e garantir que o participante se familiarize com o ambiente.
Se o entrevistador for naturalmente uma pessoa empática, os participantes tendem a se abrir mais. Além disso, garantir que as perguntas sejam abertas, ao invés de objetivas, também ajuda. Praticar a escuta ativa e encorajar o participante a contar a própria história é essencial.
No exemplo citado pelo artigo, um Cassino de Nevada queria expandir as atividades e, para isso, buscou entender o que os frequentadores mais buscavam num cassino.
Eles então convidaram um grupo bem diverso de novos clientes para conhecer o lugar acompanhados de etnógrafos. Antes de entrar de fato, as pessoas se sentaram em sofás numa antessala, receberam bebidas e comida, enquanto os etnógrafos se apresentavam e descreviam calmamente o estudo. Então, cada um recebia 50 dólares e eram convidados a conhecer o cassino como bem entendessem. As impressões de cada um eram registradas enquanto eles conheciam o local e eram monitorados por smartwatches.
Uma hora depois, retornavam à antessala, onde podiam usar os banheiros e recebiam mais comidas e bebidas. Só então os etnógrafos perguntavam sobre o que eles consideram importante em um novo cassino.
Os dados mostravam grandes frustrações quando eram interrompidos nos caminhos até as mesas de jogos. Eles também tinham dificuldades em encontrar os restaurantes e os mais velhos não conseguiam ler o cardápio. A parte mais imersiva era a interação com os dealers das mesas. Todos esses são dados de Customer Experience que raramente seriam obtidos de outra forma, mas que fazem toda a diferença para o cliente.
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DEFINIÇÃO
O próximo passo, a definição dos problemas a serem resolvidos, envolve identificar justamente as fontes de frustração e decidir quais atacar. A frustração se manifesta como uma resposta ao stress, produzindo sinais físicos, como coçar a cabeça, balançar os pés e dar respostas secas. A frustração ao usar um produto geralmente se manifesta em repetir passos para tentar fazer o produto funcionar e ficar mexendo de um jeito desajeitado em botões, por exemplo.
A tolerância até o ponto de frustração varia muito de pessoa para pessoa e de acordo com o contexto, por isso é importante controlar essas variações num grupo de estudo. Só assim é possível classificar as dores do cliente e entender quais as mais urgentes. De novo, as medições neurológicas ajudam muito a obter uma precisão, mas se basear nesses fatores óbvios que a pessoa externaliza já é um bom começo.
Um exemplo com o qual todo mundo se identifica são filas. E ninguém no mundo lida melhor com elas do que a Disney. A Walt Disney Imagineering, que é o grupo responsável pelo design dos parques temáticos da disney, criou todo tipo de mock-up imaginável, de storyboard a maquetes a simulações em VR, só pros designers conseguirem achar os pontos de frustração do parque e prevenir que eles aconteçam.
Foi assim que a Disney descobriu que filas que tão sempre se movimentando e placas com o tempo de espera até chegar no brinquedo diminuem o stress associado à incerteza. Além disso, eles diminuíram os obstáculos entre as atrações, tirando pontos de estrangulamento do fluxo de pessoas, chegando ao ponto de diminuir até o tamanho dos canteiros de flores pra otimizar a passagem.
Os dados mostraram que os momentos de frustração nas filas são muito raros. As entradas das atrações são muito bem pensadas, dando aos visitantes um quebra-cabeça gigante pra resolver. Na verdade, em metade das pessoas analisadas, entrar num brinquedo era mais imersivo do que de fato estar no brinquedo.
Além disso, a imersão é contagiosa – e os pontos de frustração são diminuídos – quando um grupo de pessoas compartilha uma experiência. Ver outra pessoa descobrindo um Easter egg, alguma coisinha escondida na entrada de um brinquedo, faz com que todo mundo em volta se anime e assim a frustração de estar esperando na fila diminui coletivamente.
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PROTÓTIPO E TESTES
É essencial criar um protótipo e testar em escala menor antes de se comprometer com a produção em larga escala – e é importante continuar testando e aprimorando depois que eles chegam no mercado. Pesquisas e grupos focais são métodos falhos para testar protótipos por diversos motivos. Primeiro, mudanças de design geralmente são percebidas inconscientemente, então é difícil fazer com que a pessoa fale sobre elas sem que seja induzida (e aí a gente já cai de novo naquela ideia de que o cérebro cria uma mentira só pra dar uma resposta). E mesmo assim, as respostas, ainda que dentro de uma escala, são completamente subjetivas. Uma mudança que significa uma nota 10 para você e para mim não necessariamente tem o mesmo peso para ambos.
Ao testar experiências mais inovadoras ou não-usuais, existe um outro obstáculo: As pessoas não têm um ponto de referência para descrever o que e, especialmente, por quê elas gostam de algo quando nunca testaram nada parecido.
Determinar se um cliente pretende comprar um produto requer dados do valor emocional percebido. São as emoções que determinam as compras, principalmente quando se trata de um bem supérfluo. Mas, como dito anteriormente, o cérebro esconde as respostas emocionais do nosso consciente. Como consequência, prever uma compra futura só com base na intenção de compra é muito complicado. Uma das maneiras de fazer isso é observar por quanto tempo os testadores engajam com um protótipo ou produto.
Em testes para um produto de realidade virtual, o tempo de uso aumentou conforme o número de palavras emocionais (positivas) usadas para descrever a experiência dos participantes. Outra medida observável é o número de participantes dos testes que perguntam sobre como comprar o protótipo.
A Electrolux é um bom exemplo de como fazer esses testes. Eles têm um laboratório em Estocolmo que parece, na prática, com uma cozinha numa casa normal. A diferença é que eles têm 15 câmeras escondidas pela cozinha para ver todos os ângulos da interação dos testadores com os protótipos. Aliado a isso, os usuários são constantemente questionados sobre o uso dos produtos e alguns dos testes incluem o uso de smartwatches para coleta de dados neurais.
Esses dados são essenciais para entender picos de imersão que resultam em alegria ao usar os equipamentos ou frustração quando a pessoa não entende por exemplo como ajustar os controles de alguma coisa. São eles também que guiam as perguntas que serão feitas.
De novo, as perguntas sempre são abertas, permitindo que os consumidores falem sobre a experiência por conta própria. Além disso, eles monitoram o tempo gasto para fazer cada coisa funcionar e anotam quaisquer indicadores de respostas emocionais. Só depois de juntar todos esses dados o time de produtos decide se um novo produto está pronto ou não para entrar no mercado.
O futuro da Customer Experience depende de dados sem interferência.
Resumindo então: Os times de Produtos e Customer Experience estão usando cada vez mais insights neurais pra determinar o que os consumidores realmente valorizam, o que traz alegria pra eles e o que reduz ou elimina dores e frustrações. Um design inteligente de produtos, baseado em dados neurológicos e psicológicos, fornece uma experiência extraordinária, aumentando muito a lealdade e a rentabilidade de um consumidor. Conforme a tecnologia usada para obter esses dados se torna mais acessível e menos incômoda pro usuário, a tendência é que as empresas se distanciem cada vez mais de dados enviesados fornecidos pelo próprio usuário, e passem a usar mais dados obtidos durante o uso, sem interferência.