A importância dos arquétipos para as marcas
O que é um arquétipo
Arquétipos são basicamente um conjunto de ideias e maneiras de pensar moldadas pela cultura ao nosso redor. Eles representam personagens facilmente identificáveis, que fornecem gatilhos emocionais e mentais e esses, por consequência, despertam desejos humanos (muitas vezes de maneira inconsciente).
Quem definiu o conceito atualmente usado pelas marcas de arquétipos foi Jung. O psiquiatra suíço, interessado em como os símbolos e mitos afetam nossa mente tanto consciente quanto inconscientemente, notou que existe um número diverso de arquétipos com os quais todos nós nos identificamos. Esses padrões atuam em nível subconsciente, levando a comportamentos, desejos, valores e motivações comuns a todos que se identificam com o(s) arquétipo(s) em questão.
Em oposição à persona, que representa a imagem que nós queremos transmitir para o mundo exterior, os arquétipos representam nossos anseios, vontades e valores mais profundos.
O arquétipo e a marca
Sua marca é um dos seus patrimônios mais importantes. Uma marca bem construída, com valores sólidos e ideais bem definidos, faz com que seus clientes sejam mais leais, paguem mais caro e consumam mais produtos. Por isso ter uma identidade bem definida, coesa e que transmita seus valores, é o que diferencia a sua marca dos concorrentes.
Além disso, ter um core sólido permite que mudanças sejam feitas afim de modernizar a marca ao longo do tempo, norteando todas as decisões de branding.
Em resumo, é aí que entra o arquétipo. Construir a sua marca em cima de um arquétipo bem definido cria consistência entre suas campanhas de marketing, comunicação em redes sociais e até extensões ou adaptações de identidade visual.
Uma maneira simples de definir o arquétipo de uma marca é encaixar os seus ideais em um perfil com as seguintes características:
- Um DESEJO, que delimita em termos gerais as principais motivações do arquétipo;
- Um OBJETIVO, que define o principal resultado do arquétipo;
- Um MEDO, que se resume no que o arquétipo mais teme;
- Uma ESTRATÉGIA, que resume o plano de ação que o arquétipo usaria para atingir seus objetivos e suprir seus desejos;
- Uma ARMADILHA, ações ou qualidades desse arquétipo que podem desviá-lo do seu objetivo ou colocá-lo em problemas; e
- Uma DÁDIVA, qualidades únicas daquele arquétipo que podem ajudá-lo a obter sucesso.
Como separar e agrupar os arquétipos
Talvez a divisão mais famosa de arquétipos em grupos seja a proposta por Mark & Pearson (2001) em O Herói e o Fora-da-Lei. De acordo com as autoras, os arquétipos podem ser separados em quatro grupos:
- Provê estrutura para o mundo: Criador, Governante e Cuidador.
- Anseia pelo Paraíso: Inocente, Sábio e Explorador.
- Quer deixar uma marca no mundo: Fora-da-Lei, Mago e Herói.
- Busca se conectar com os outros: Pessoa comum, Bobo da corte e Amante.
No entanto, no entendimento de outros autores mais modernos (e, humildemente, no meu) essa divisão faz pouco sentido. Um estudo de Spangenberg (2021), propõe a seguinte divisão:
Quatro arquétipos compõem o primeiro cluster (Sensação de Calma) por conta da sua presença mutuamente calma. Os arquétipos nesse cluster (Cuidador, Inocente, Pessoa comum e Sábio) não são necessariamente não-emocionais, mas exalam uma ‘aura’ calma que faz com que as pessoas não se sintam exatamente agitadas na sua presença. Por exemplo, apesar de o Cuidador e o Sábio diferirem nas tendências de criar relações (Cuidador) e influenciar as massas (Sábio), nenhum dos dois tem a intenção de agitar o público à sua volta.
O segundo cluster (Alta influência social) é composto por três arquétipos muito emocionalmente estimulantes, com grande influência social — Herói, Fora da lei e Governante.
O cluster três (Estímulo emocional positivo) também é formado por três arquétipos altamente estimulantes — Amante, Bobo da corte e Mago, mas que buscam relações mais íntimas.
Por fim, um último cluster composto de dois arquétipos — Explorador e Criador — que são relativamente neutros nessas duas dimensões (calmantes ou excitantes). Ambos são movidos por uma força muito mais interna e buscam um Senso de Admiração. Apesar de também serem capazes de influenciar os outros, essa não é sua força motriz principal. Por conta disso, nenhum dos dois tem a capacidade consistente de animar os outros e nem de acalmar.
Os doze arquétipos
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Cuidador (Servir)
- Desejo: Proteger os outros do perigo
- Objetivo: Ajudar os outros
- Medo: Egoísmo, ingratidão
- Estratégia: Fazer as coisas pelos outros
- Armadilha: Se auto martirizar, acabar sabotando o outro
- Dádiva: compaixão, generosidade
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Inocente (Segurança)
- Desejo: viver no paraíso
- Objetivo: ser feliz
- Medo: fazer algo ruim ou errado e ser punido por isso
- Estratégia: fazer as coisas certas (sempre)
- Armadilha: medo constante de errar
- Dádiva: fé e otimismo
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Pessoa Comum (Pertencer)
- Desejo: conectar-se com os outros
- Objetivo: pertencer, se encaixar
- Medo: se destacar, ficar de fora, ser rejeitado por agir como se fosse superior
- Estratégia: desenvolver virtudes sólidas, se misturar, senso comum
- Armadilha: desistir de se encaixar, em troca de conexões superficiais
- Dádiva: realismo, empatia, despretensão
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Sábio (Entender)
- Desejo: descobrir a verdade
- Objetivo: usar a inteligência e poder analítico para desvendar o mundo
- Medo: ser enganado; ser ignorante
- Estratégia: buscar o conhecimento e a sabedoria; autorreflexão; entender processos lógicos
- Armadilha: estudar demais e nunca agir
- Dádiva: sabedoria, inteligência
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Governante (Controlar)
- Desejo: controlar
- Objetivo: criar uma comunidade, empresa ou família próspera
- Medo: caos, ser destronado
- Estratégia: exercer o poder de liderança
- Armadilha: ser mandão demais, autoritário
- Dádiva: responsabilidade, liderança
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Fora da Lei (Libertação)
- Desejo: revolução, vingança
- Objetivo: destruir tudo o que não funciona (para ele mesmo ou para a sociedade)
- Medo: ser impotente, trivial
- Estratégia: chocar, destruir, causar
- Armadilha: se voltar para a criminalidade/se tornar uma pessoa ruim
- Dádiva: liberdade radical, ultrajante
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Herói (Ser o melhor)
- Desejo: provar que é valioso/merecedor através de atos corajosos e quase impossíveis
- Objetivo: exercer a maestria de maneira que melhore o mundo
- Medo: fraqueza, vulnerabilidade, covardia
- Estratégia: ser tão forte, competente e poderoso quanto puder
- Armadilha: arrogância, desenvolver a necessidade de TER um oponente
- Dádiva: competência e coragem
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Amante (Intimidade)
- Desejo: intimidade e prazer
- Objetivo: se relacionar com pessoas, experiências, lugares (e trabalho) que amam
- Medo: ficar sozinho, rejeição, não ser amado
- Estratégia: se tornar cada vez mais atraente fisicamente, emocionalmente e de todas as maneiras possíveis
- Armadilha: fazer de tudo para atrair e agradar os outros, acabar perdendo a própria identidade
- Dádiva: paixão, gratidão, compromisso
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Bobo da corte (Alegrar)
- Desejo: viver o momento ao máximo
- Objetivo: se divertir e divertir o mundo
- Medo: tédio ou ser entediante
- Estratégia: brincar, fazer piadas, ser engraçado
- Armadilha: desperdiçar o tempo dos outros
- Dádiva: alegria
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Mago (Poder)
- Desejo: sabedoria, entender como todo o universo funciona e suas leis
- Objetivo: tornar sonhos realidade
- Medo: consequências negativas imprevisíveis
- Estratégia: criar uma visão de mundo e vivê-la
- Armadilha: se tornar manipulador
- Dádiva: encontrar situações onde todos saem ganhando
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Explorador (Liberdade)
- Desejo: liberdade de descobrir quem é ao explorar o mundo
- Objetivo: experienciar uma vida mais autêntica, melhor e satisfatória
- Medo: ficar preso, se conformar, se sentir vazio, ‘não ser’
- Estratégia: procurar e experienciar coisas novas, fugir da ‘mesmice’
- Armadilha: vagar sem rumo, virar um ‘misfit’ (alguém que não se encaixa em lugar nenhum)
- Dádiva: autonomia, ambição, habilidade de se manter fiel às próprias ideologias
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Criador (Inovar)
- Desejo: Criar algo com valor duradouro
- Objetivo: dar forma a um pensamento
- Medo: ter uma visão medíocre/executar as coisas da maneira errada
- Estratégia: desenvolver controle e habilidades artísticas; criar cultura; expressar a própria visão
- Armadilha: perfeccionismo, criar algo da maneira errada
- Dádiva: criatividade e imaginação
E, mais importante, como usar os arquétipos a favor da sua marca?
Antes de mais nada, seja sincero. O consumidor sabe o que procura (ou pelo menos acha que sabe). A identificação arquétipo-marca-consumidor precisa ser natural. Consumidores que acreditam nos valores que o arquétipo da sua marca transmite vão se identificar, com toda a certeza, com a sua marca. Da mesma forma, se essa correlação entre a marca e o arquétipo for forçada, as pessoas vão perceber.
Então, mais do que se preocupar com o arquétipo simplesmente porque ele é parte da criação da marca, atente-se aos seus valores e aos valores que a marca quer transmitir. Preocupe-se, em primeiro lugar, em criar uma personalidade que de fato seja coerente com a sua filosofia. O arquétipo será definido eventualmente nesse exercício.
Além disso, lembre-se que não tem problema em usar um segundo arquétipo de vez em quando (ou até um terceiro, mais raramente). As pessoas também não têm um arquétipo só e é muito comum ‘emprestar’ algumas características de outro arquétipo que não o principal.